Mobilidade versus Acessibilidade no Planejamento de Transportes
Autor: Jefferson Hishiyama.
Em revistas, noticiários e conversas em bares e cafés é corriqueira a discussão sobre os desafios de mobilidade urbana que vivenciamos em nosso dia a dia. O assunto ganhou repercussão especialmente após a aprovação da Política Nacional de Mobilidade Urbana instituída pela Lei 12.587 de janeiro de 2012, a qual busca orientar políticas de transportes para melhorar a acessibilidade e mobilidade das cargas e pessoas nos municípios brasileiros. Embora os termos mobilidade e acessibilidade sejam livremente inter-relacionados pelo público em geral, no planejamento de transportes se faz importante observar suas peculiaridades, sendo notado nos últimos anos o ressurgimento do olhar para políticas de planejamento de transportes voltadas à promoção da acessibilidade no contexto urbano.
Congestionamentos e superlotação no transporte público são queixas frequentes em qualquer centro urbano brasileiro, sendo, por vezes, o aumento da velocidade de deslocamento dos veículos apontado como solução para os problemas de transporte. Entretanto, seria o aumento da velocidade sinônimo de sucesso de políticas de transportes? Nesse ponto, é interessante salientar que o incremento de facilidade de deslocamento entre uma origem e um destino dentro de uma viagem é entendida como mobilidade. E embora a mobilidade vise minimizar os custos sociais e ambientais através do aumento de velocidade, e consequentemente capacidade de transporte, quando não bem planejada, pode desencadear viagens a locais cada vez mais remotos de trabalho e de compras, o que acaba contribuindo para a dispersão urbana. Aliás, dispersão urbana, uso eficiente do solo e gestão energética são elementos essenciais no processo de planejamento de transportes e uso do solo, uma vez que ditam decisões da vida em sociedade, como o local de residência, estudo, trabalho e lazer, por exemplo.
A complexidade de comportamento de viagens tem levado pesquisadores e profissionais de planejamento territorial e de transportes a observar a problemática de deslocamentos urbanos para além de simplesmente facilitar o movimento de pessoas e mercadorias, mas sim ampliar a facilidade de atingir lugares segundo seus desejos de atividades. Esse conceito é entendido como acessibilidade, o qual cabe ressaltar que não é novo, foi apresentado inicialmente por Hansen ainda em 1959 quando o mesmo a definiu como “a potencialidade de oportunidades para interação” e propôs que a acessibilidade fosse uma possível medida de mensuração da eficiência da interação entre uso do solo e sistemas de transporte. Embora o conceito seja amplamente investigado na academia, ainda hoje, a implantação da acessibilidade como instrumento prático para o planejamento urbano é um desafio ao redor do mundo. No entanto, alguns locais se encontram na vanguarda dessa mudança de paradigma, como a comunidade europeia e Oceania. Como exemplo, entre 2010 e 2014, a Cooperação Europeia em Ciência e Tecnologia (sigla COST em inglês) desenvolveu uma ação envolvendo 22 países para que através de workshops e investigações pudessem minimizar o gap entre modelagem e práticas quanto ao uso da acessibilidade como instrumento de planejamento nos países envolvidos.
Assim, ao nos questionarmos sobre como podemos solucionar problemas de deslocamentos diários, é importante refletirmos também sobre a localização de nossos destinos e como nossas atividades de trabalho, estudo, compras e lazer estão sujeitas a esses movimentos. No entanto, não cabe ao planejamento de transportes um giro de 180°, mas é necessário que seja ampliada a discussão para além da mobilidade urbana, incorporando também as complexidades relacionadas a outros elementos do fenômeno urbano de transportes, como propõe a acessibilidade.